5.9.07

Meu quarto, meu mundo



O sueco Jens Lekman, 26 anos, admite que nunca leu Viagem ao Redor do Meu Quarto, do francês Xavier de Maistre. Mas assume que o título do livro de 1794 serviu de guia espiritual para o álbum Night Falls Over Kortedala (***), que chega hoje às lojas da... Suécia.

Nos Estados Unidos, desembarca só em outubro. No Brasil, talvez nunca.

A referência literária o veste com perfeição. Por dois motivos: 1. O pop barroco de Jens pode até soar às vezes grandioso, mas é arquitetado quase todo em esquema caseiro, e 2. O compositor trabalha com samplers de discos antigos para, no esquema recorte-e-cole, chegar a canções que parecem novinhas em folha.

É, digamos, uma espécie de "homem que copiava" europeu. Pertence sim àquela geração ansiosa que, satisfeita com o título, dispensa o livro. Para economizar tempo.

Essa aflição (e aí está o lado meio milagroso desta história) não transparece no disco, que impressiona pela forma cristalina e elegante como filtra um milhão de influências. Desde já, está cotado para contaminar listinhas de fins de ano de jornalistas daqui, dali e de todo lugar (na Pitchfork, aliás, o álbum recebeu uma nota alta... até demais?).

Se a sonoridade revela tantos detalhes quanto a de um álbum do Sufjan Stevens, a pose de crooner irônico e deprê faz de Jens descendente do Magnetic Fields, de Jarvis Cocker, de Morrissey. Mas ele tem marca: usa melodias pomposas para observar o cotidiano de um bairro sueco monótono da janela de uma casa friorenta. "Não haverá beijos esta noite", e ele começa assim, na faixa And I Remember Every Kiss.

Logo depois, arrisca embalos disco, arranha um rockabilly datado, desaba de amores em baladonas monumentais. Trancado no quarto, mas com a cabeça a mil.

O álbum é lançado na Suécia pelo selo Service.

Ouça! The opposite of hallelujah (salvar destino como)

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